O absoluto desrespeito
institucional que significa classificar a Suprema Corte do País como
tribunal de exceção por causa do julgamento do mensalão é despropósito
que beira o golpismo. Mais absurdo ainda é verificar que essa tentativa
de golpear uma das instituições fundamentais do sistema democrático é
explicitamente estimulada pelo partido que há mais de uma década exerce -
inclusive pelos meios ora judicialmente condenados - a hegemonia
política no plano federal: o PT.
Na véspera da comemoração do Dia
da República, o diretório nacional do PT divulgou nota oficial em que
define sua posição a respeito do julgamento pelo STF, ainda em
andamento, da Ação Penal 470, no qual já foram condenados por crimes de
corrupção ativa e formação de quadrilha os então dirigentes do partido,
de direito e de fato, que urdiram e executaram a trama criminosa da
compra de apoio parlamentar dos principais líderes dos "300 picaretas"
que dominam o Congresso Nacional, segundo memorável julgamento feito por
Luiz Inácio Lula da Silva em 1993 - quando ainda estava muito longe do
Palácio do Planalto.
O argumento central da nota oficial petista é
de que o STF fez um "julgamento político" com a intenção deliberada de
"criminalizar o PT": "Trata-se de uma interpretação da lei moldada
unicamente para atender à conveniência de condenar pessoas específicas
e, indiretamente, atingir o partido a que estão vinculadas". Ou seja, os
ministros do Supremo, que, em ampla maioria foram nomeados pelos
governos do PT, estariam conspirando para acabar com o partido a quem
devem as togas que envergam. Para tanto, não se constrangem, segundo a
nota, em desrespeitar "garantias constitucionais" e instalar "um clima
de insegurança jurídica"; de lançar mão de "uma teoria nascida na
Alemanha nazista" (a teoria do domínio do fato); de adotar a "noção de
presunção de culpa em vez de inocência".
Além disso, alegam os
petistas, os ministros "confirmaram condenações anunciadas, anteciparam
votos à imprensa, pronunciaram-se fora dos autos e, por fim,
imiscuíram-se em áreas reservadas ao Legislativo e ao Executivo, ferindo
assim a independência entre os poderes". Em outras palavras: os
ministros do STF estão tendo um comportamento condenável.
Ao
divulgar a nota à imprensa, o iracundo presidente do PT, Rui Falcão,
reforçou todos os argumentos contidos no documento, mas, pressionado a
opinar se não há nada de positivo que se possa extrair do julgamento do
mensalão, meteu os pés pelas mãos e contradiz-se ao apelar para o mantra
petista segundo o qual este é hoje um país em tudo muito melhor do que
antes: "As instituições estão funcionando legalmente". Não há registro
de que algum impertinente tenha perguntado: "Inclusive o STF?".
Para
todos os efeitos, a liderança petista dá a entender que a nota de 14 de
novembro encerra o assunto. É indisfarçável a intenção de preservar o
partido do prolongamento de uma polêmica que o faz sangrar em público.
Mas os termos da nota e a intenção dissimulada dos dirigentes petistas -
além dos apelos dos próprios condenados - estimulam as alas radicais do
partido e das organizações sociais que o apoiam a atuar com a "mão do
gato", mobilizando-se em "defesa do PT".
Exemplo claro é a
atitude do esquerdista radical Markus Sokol, integrante do diretório
nacional do PT, para quem existe "insatisfação na base do partido" e por
isso se impõe a realização de atos públicos para "manifestar repúdio"
ao julgamento do STF. E afirma, escancarando intenções golpistas: "Para
além do apenamento, há uma agressão ao PT. Se ficar sem resposta, outras
organizações que incomodam a elite dominante não poderão se sentir
garantidas".
Por sua vez, a "Consulta Popular", organização que
alega reunir representantes de 17 Estados, ao final de uma reunião
plenária de três dias conclamou à luta "pela revogação das condenações e
das penas ilegalmente impostas". Não fica claro no documento, diante do
princípio da independência e autonomia dos poderes, a quem caberá a
responsabilidade de "revogar" as condenações e as penas. Talvez um Ato
Institucional?
Fonte: O Estado de S. Paulo
Um comentário:
Muito bom, mas pensei que era de sua própria "autonomia", Gilmar!
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